sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Superfície Desconhecida

São as palavras, são os símbolos, os gestos e as feições. São, acima de tudo, expressões. Como um poeta louco com um rascunho de certa carta extraviada propositalmente em mãos, minh'alma se agita entre dedos e repousa nos meus traços. Enquanto, em devaneios, reflito almas intensas, me detenho em suas sensações. Observo mentes que se revolvem em espirais, feitas de sonhos. Emoções. Em certos momentos, desejo vorazmente que os formatos de tais espirais e suas cores e luzes sejam notados por alguém, assim como espero que ouça seus acordes, que sinta a textura, que em sua boca derreta com gosto enquanto aspira, já em outros espaços, seu perfume. Sim, todas as sensações em unidade. E é por isso, por querer compartilhar desta loucura, que desejo que alguém olhe para dentro de mim, mesmo que por alguns instantes. É uma inconstância constante. Algo pulsante, enérgico e ao mesmo tempo frágil e melancólico. Durante um longo e fatigante período me abstive do choro, e creio que até quisesse praticá-lo, por vezes. Na verdade, minha sequidão exterior acabou por tornar-se um jugo. Insuportável. Há pouco tempo, porém, lembrei-me de como é estranhamente puro,frenético, deprimente e abeçoador um choro. Sabendo que outra longa era passará até que isto me suceda novamente, faço das letras o meu pranto. Não um pranto pesado, carregado de tristezas e derrotas e entrecortado por soturnos soluços guturais, porém um pranto brando, pensativo, enigmático, suave, que agora permanece imóvel, mas que saiu ácido como um vômito. Regurgito-o, então, sem lágrimas, por que alguém irá sorver estas palavras, e em sua boca notará o gosto salgado que possuem, pois que não caíram de meus olhos, mas se alojaram entre as linhas. Não quero, também, que à todas estas palavras seja atribuído um tom grave e angustiante, antes se assemelhem à claridade de um luar, assim como o que chegava até mim há poucos instantes pela janela de meu quarto escuro, ao qual deixou vagamente iluminado, não dando forma aos objetos, apenas sugerindo-os. Acredito que seja uma boa dose de mim. Não poderei atribuir porcentagens, pois somos nós que damos um ponto final ao nosso infinito. Mas ainda assim, estarei oferecendo a alguém, uma rara chance de me ver. Talvez eu não queira mesmo encontrar esse alguém... Estranho isso... Mas queria mesmo saber o que uma rápida demonstração de meu interior traria à suposta alma que o visse. Talvez seja perda de tempo, ou talvez, como imagino, podemos construir o mundo todo a partir de nossas almas. E talvez um dia eu esteja lá, em seus pensamentos, não como um hóspede, mas habitando... Nem sempre eu soube de toda a verdade, e aqui talvez nunca saiba mesmo, mas ela vem se revelando ao longo do caminho. Era a verdade, mas à ela fechei os olhos, por um momento. Confesso que tive medo de olhá-la assim de repente, porém agora já estou cicatrizando de muito do que já me chegou ao conhecimento. Mas o tempo escoa rápida e sutilmente e chega um ponto que tudo torna-se mais cansativo do que já foi, e minhas palavras ficam tediosas até para mim. Não consigo seguir um padrão. Deve haver lógica para tudo isso.Eu, contudo, não a acho. Tão estranhamente como surgiram, meus pensamentos se espalham como fumaça, e voam tão vagos que não mais os reúno. Aos poucos, me trancafio novamente dentro de mim. Talvez eu venha à tona novamente... Se isso acontecer, espero emergir em um olhar onde já sobrevoei, onde as espirais já estejam em sua alucinada dança, como uma recepção involuntária... Um olhar distante, alheio, sereno e azul como o mar...